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Bate-papo virtual com Mary Del Priore encerrou eventos do mês da mulher

Confira como foi o evento com a historiadora
6 de abril de 2023

Para encerrar uma série de atividades especiais em alusão ao mês da mulher, a APMP realizou um bate-papo virtual com uma das maiores historiadoras brasileiras, Mary Del Priore. O evento foi realizado no dia 29 de março, de maneira totalmente on-line, e contou com a participação de mais de 50 pessoas. 

O bate-papo teve como tema central “Homens e Mulheres ao longo da história: negociação e conflito”, trazendo uma linha do tempo cronológica de como os papéis do homem e da mulher foram forjados até os dias atuais. 

A Diretora de Mulheres Associadas da APMP e promotora de Justiça, Mariana Dias Mariano, abriu o evento enaltecendo a carreira da historiadora. “É realmente muito especial ter a Mary aqui conosco hoje. É uma escritora e historiadora e uma verdadeira referência para todas nós. É um momento muito importante para nossa associação”, destacou a diretora. 

Na sequência, o presidente da APMP, André Tiago Pasternak Glitz, desejou boas-vindas à convidada, relembrou os eventos especiais realizados pela associação no mês da mulher, fez um breve histórico da diretoria de mulheres e na sequência reverenciou à obra de Mary Del Priore, com uma breve reflexão.  

“Sempre faço a reflexão de qual é o meu papel enquanto homem, de como podemos contribuir para que possamos avançar mais, todos juntos no tema relacionado à diferença de gênero. Quando nós abrimos espaço para as mulheres, a história nos comprova isso, nós sempre avançamos. Temos ganhos civilizatórias representativos com essa participação. Penso que é um compromisso que precisa ser assumido por todos, especialmente pelos que exercem funções de liderança”, disse Glitz. 

Antes do início da palestra, a promotora de Justiça e associada da APMP, Mariana Seifert Bazzo, ressaltou a importância da história e por consequência da historiadora Mary Del Priore na luta contra a violência de gênero contra as mulheres.  

“Para se entender violência de gênero contra mulheres, nós precisamos das histórias das mulheres. É a única forma lógica de convencer todos os públicos (homens, mulheres, progressistas, conservadores) de que a ação afirmativa de hoje das mulheres faz sentido. Porque é por meio da história que vamos ver a imensa desigualdade que existe entre homens e mulheres, um fosso de desigualdade que existe há milênios”, explicou Bazzo. 

A construção da relação homem e mulher durante 400 anos 

Mary Del Priore abriu sua palestra lembrando que a inferioridade feminina é algo que foi imposto pelas sociedades por 400 anos. Por outro lado, os homens são criados dentro dos patriarcados há séculos. De acordo com a historiadora, no Brasil os homens são resultados de três tipos de patriarcados, oriundos de diferentes culturas: os patriarcados das próprias nações originais, o patriarcado africano e o patriarcado branco. Todos tratando, dentro dos seus rituais, o homem como a figura central, hétero e superior. 

Ela lembrou que essa condição de superioridade masculina foi sendo construída ao longo dos séculos, que vem desde a legislação do Código Filipino do século XVII, que permitia até a execução das mulheres em casos de adultério. Essa condição de superioridade do homem foi reforçada ao longo dos tempos, com o respaldo da Igreja Católica com cultura do patriarcado, do casamento e da inserção das mulheres na vida sexual apenas após o casamento, sob as bênçãos do espirituais da igreja. 

O patriarcado no Brasil no século XIX 

Fazendo o paralelo com a história do Brasil, a convidada apontou que os papéis também foram definidos dessa maneira até o século XIX, especialmente com a chegada da corte real portuguesa no país, uma vez que Dom Pedro fazia o papel do patriarcado, com vida dupla, enquanto sua esposa Maria Leopoldina teve vários filhos em curto espaço de tempo, o que reforçava a condição das esposas de reprodutoras. 

Mary Del Priore lembra que, na segunda metade do século XIX, ocorreu um fortalecimento da cultura católica no país. Com isso, as mulheres se casavam e passavam a ser tratadas quase como santidades, um paralelo com a virgem maria. Seguiam sendo seres com finalidades reprodutivas, com famílias enormes. Enquanto isso, os homens seguiam com vida dupla, buscando a sexualidade nas ruas, fora do casamento. 

A primeira onda do movimento feminista no Brasil 

A realidade passou a mudar no final do século XIX, com o primeiro movimento feminista e o grito das mulheres por alguns direitos políticos e jurídicos mundo afora, como lembra a historiadora. 

Del Priore explicou que a industrialização no país foi responsável por, enfim, tirar a mulher do papel de apenas dona de casa para cumprir rotinas nas fábricas. Como consequência dessa quebra de cultura, iniciou-se um processo de crises nas famílias. 

Na sequência, a historiadora relembrou o aparecimento do estereótipo de “mulher trabalhadora”, que se dividia nas atividades fora de casa e nos cuidados com o lar, enquanto o homem seguia sendo a figura central. 

Nesse contexto, ela lembrou da segunda onda feminista já na segunda metade do século XX, que veio juntamente com novidades, como por exemplo a inserção das pílulas anticoncepcionais na sociedade. Além disso, o movimento fortaleceu os conceitos de igualdade no trabalho, igualdade de oportunidade e também de sexualidade. 

A violência contra mulher ganha manchetes no país e as primeiras leis voltadas para as mulheres 

Nos anos 80 e 90, Priore lembrou que o país viveu um choque ao ver o tema de violência contra as mulheres tomarem conta dos jornais. A violência, que nunca deixou de existir, passa a ser divulgada, enquanto a cultura de fortalecimento do macho alfa era inflada, sendo iniciada muitas vezes dentro de casa. 

A historiadora apontou que com o processo de redemocratização do país foram inseridas pela primeira vez algumas leis voltadas para a mulher. 

Por fim, ocorreu a otimização da masculinidade tóxica, enquanto o movimento feminista, em sua terceira onda, passou a deixar de lado pautas gerais e começou a agir com pautas específicas, com uma certa perda de foco, o que acabou dificultando alguns processos, de acordo com Mary Del Priore. 

Ao final, a convidada fez uma breve reflexão sobre as relações homens e mulheres e toda a construção de estereótipos durante os séculos.  

“Nossa história é relacional, nós somos mulheres com os homens. Penso que temos de ouvir o outro lado, no caso os homens, tentando entender que, da mesma maneira que somos prisioneiras de determinadas representações, eles são também até hoje, infelizmente, de representações que estão se retroalimentando”, apontou. 

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