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EDITORIAL - Março, Mulheres, Encontros e Vida

Confira Editorial conjunto de Amanda Ribeiro dos Santos e Mariana Dias Mariano
8 de março de 2022

Antes de iniciarmos este breve texto, convidamos as leitoras e leitores a ouvir a música Águas de Março, com a voz e a brilhante interpretação de Elis Regina e Tom Jobim (c). Aconselhamos que feche os olhos e sinta os versos que tão bem representam a força feminina: “São as águas de março fechando o verão. É a promessa de vida no teu coração”. 

Não há como negar que a arte conecta e decifra a imensidão de sentimentos que inauguraram esse novo ano. Estreamos com o anseio de retorno seguro ao vigor da vida que tanto nos preenche - abraços, felicitações e celebrações se tornaram novamente possíveis  - depois de dois anos de dor e medo.  

Milhares de vidas, desejos e projetos se foram de modo repentino, em um momento de luto engasgado. O consolo de tanta tristeza surgiu com a esperança das vacinas e de um suposto aprendizado para o futuro próspero e reservado a nós sobreviventes, que por razões desconhecidas ainda estamos neste plano físico. 

Entretanto, o imaginário coletivo aponta que tempos sombrios ameaçam retornar (Hannah Arendt?) com as notícias advindas dos conflitos armados no Leste Europeu, que, além de causarem normalmente mais comoção internacional - pois o caos da guerra atinge a civilização do Norte Global -, nitidamente envolvem questões atuais e muito complexas, como o racismo e a xenofobia.   

A angústia de presenciar mortes injustas e a sensibilidade do olhar encontra a história da criança Polina, uma estudante ucraniana de sorriso tímido e mechas rosas, que foi atingida na companhia de sua família pelos horrores da guerra e os seus sonhos foram injustamente interrompidos. Em outro giro, nos deparamos com uma menina imigrante e negra acuada e de olhar assustado, que busca abrigo no colo do seu pai apreensivo, após não serem reconhecidos com a mesma dignidade humana dos nacionais do país atacado e, por essa razão, impedidos de embarcar em um trem com destino a solo seguro para salvar as próprias vidas. 

Infelizmente, a guerra não é algo inédito em nossos tempos, pois a humanidade ainda segue uma lógica de poder, morte, exclusão e apagamento, nada obstante os avanços proporcionados pelos sistemas regionais e internacionais de proteção dos direitos humanos.  

É imprescindível pontuar que a pandemia e a guerra afetam de maneira desproporcional as mulheres, em múltiplos instrumentos de violência com base nos marcadores gênero e raça: sobrecarga de cuidados, falta de assistência médica, insegurança alimentar, agressões físicas e psicológicas, estupros e feminicídios. 

Nesse contexto, convidamos à reflexão sobre a sociabilidade das mulheres como conexões de sujeitos de mudanças, especialmente diante do significado das lutas sociais, históricas e políticas que ensejaram a união de tantas de nós e relembradas no dia 08 de março, como o Dia Internacional da Mulher.  

A amizade e o afeto entre mulheres são guias para novos ventos, muito embora sejam depreciados e ridicularizados. Historicamente, “as amizades femininas foram um dos alvos da caça às bruxas, na medida em que no desenrolar dos julgamentos, as mulheres acusadas foram forçadas, sob tortura, a denunciar umas às outras, amigas entregando amigas, filhas entregando mães” (FEDERICI, Silvia. Mulheres e caça às bruxas).  

Pensando nisso, a Associação e a Diretoria de Mulheres promoverão neste mês de março os eventos Jantar Mulheres, no dia 09, em Maringá, e também Brunch Mulheres, no dia 12, em Curitiba. 

Os encontros foram inspirados na poesia de Ryane Leão, que verbaliza em versos, indagações e confrontos a profundidade do ser mulher.  

Nessa senda, a indicação literária somente poderia ser o livro da Promotora de Justiça Lívia Sant’Anna Vaz e da Procuradora Federal Chiara Ramos: “A justiça é uma mulher negra”. Uma das principais lições das autoras é o destaque à potência dos encontros de mulheres que propiciam diálogos e experiências enriquecedoras. 

Por entendermos que os avanços do universo feminino dependem da união entre todas as mulheres, e que tal união vai além de nossos muros, optamos por inaugurar as atividades do mês da mulher trazendo a lume a realidade vivida pelas mulheres em situação de rua. Assim, a APMP, por meio da Diretoria de Mulheres, promoveu um diálogo sobre aquelas que vivem em tal situação com autoridades públicas e privadas, como caminho para propositura de ações e políticas que possibilitem a superação das violências que as afetam.  

Sensível à arte, e a uma das principais violações à dignidade das mulheres que enfrentam vulnerabilidades materiais acentuadas, a associada Kátia Kruger traz dicas de um filme premiado (“Padman”) e um documentário (“Absorvendo o Tabu”), que provocam a reflexão sobre as dificuldades enfrentadas por aquelas que sequer têm acesso a produtos de higiene durante o período menstrual.  

Ainda, no ano em que o Brasil completa apenas noventa anos do voto feminino (conquistado em fevereiro de 1932), a importância do mês de março (primeira marcha das Mulheres em Washington pelo direito ao voto) pode ser revisitada com o filme “As sufragistas” (2015). Tal obra, que retrata a união de mulheres em prol da igualdade e do direito ao voto, já foi inclusive motivação de discussões, debates e reencontros em evento gestado pela Diretoria de Mulheres. Veja aqui como foi. 

Quanto à Mulher Destaque, optamos, nessa edição, por uma homenagem póstuma à inspiradora Procuradora de Justiça Édina Maria Silva de Paula, filha de Maria das Graças e Arlindo, mãe de Leonam Felipe e Lívia Beatriz, esposa de Amarildo, professora e estudante, que marcou a história do Ministério Público justamente por encontros e pela proteção apaixonada e incansável da infância e da juventude. 

Pensar em Mulheres, Encontros e Vida significa encontrar a base, a evolução, o acolhimento e o cuidado. E não menos importante, pensar em Mulheres, Encontros e Vida proporciona também acessar às tantas inquietações, que nos impulsionam em busca de mudanças e do resgate de toda a humanidade.  

 

Amanda Ribeiro dos Santos 

Mariana Dias Mariano 

Diretoria de Mulheres 

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